A
Política Nacional de Resíduos Sólidos envolveu anos de negociação no Congresso
Nacional e também a determinação política do Governo Federal, em favor de uma
mudança orientada pela sustentabilidade socioambiental da produção e do consumo
no Brasil.
Muito além de um processo político, técnico ou
logístico, trata-se de uma transição paradigmática necessária, frente à
contradição de um modelo econômico que não considera apropriadamente a finitude
dos recursos e o direito social intergeracional à vida e à qualidade ambiental.
É, portanto, uma forte transição cultural impulsionada por um dilema simbólico
e real: a sociedade diante do lixo cada vez maior.
Evidente que para vencer o enorme desafio que se
impõe, essa Política está sendo implementada por meio da criação do Plano
Nacional de Resíduos Sólidos. Tal plano foi democraticamente discutido pela
sociedade, com audiências públicas realizadas em todas as regiões do país, com
o objetivo de sensibilizar e motivar a população. Foi por essa razão que a
Política dispôs amplamente sobre os processos necessários de comunicação,
informação e educação ambiental.
A gestão ambiental configura-se como importante
forma de se estabelecer um relacionamento mais harmônico entre a sociedade, o
ambiente e os recursos naturais, em prol de uma estratégia de desenvolvimento
condigna com os desafios globais neste início do século XXI. Deve ser vista,
portanto, como instrumento de mediação de interesses e conflitos entre atores
sociais (comunidade, instituições e poder público), que agem sobre os meios
físico-natural e construído, definindo e redefinindo continuamente o modo como
os diferentes segmentos alteram a qualidade do meio e, também, como distribuem
os custos e benefícios decorrentes de suas ações. É nessa ampla frente de
atuação, que o Ministério do Meio Ambiente desenvolve seu trabalho, buscando
fomentar e potencializar ações, programas, atividades, projetos e iniciativas,
nos mais diferenciados âmbitos, com vistas a contribuir com modelos societários
cada vez mais sustentáveis, em sua dimensão socioambiental.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei
12.305/2010), regulamentada pelo Decreto n° 7.404/2010, aponta entre seus
objetivos a não-geração, redução, reutilização e tratamento de resíduos
sólidos; a destinação final ambientalmente adequada dos rejeitos; a diminuição
do uso dos recursos naturais como água e energia no processo de produção de
novos produtos; o aumento da reciclagem no país; a promoção da inclusão social
e a geração de emprego e renda para catadores de materiais recicláveis; a
logística reversa como conjunto de ações para facilitar o retorno dos resíduos
aos seus geradores para tratamento ou reaproveitamento na forma de novos
produtos.
Diante disso, é fácil compreender porque a Educação
Ambiental é reconhecida como um de seus principais instrumentos. Esta Lei, quando institui esses objetivos e o princípio da
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, abrangendo
fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores e
titulares dos serviços públicos (limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos),
prevê também o envolvimento e intensificação das ações de educação ambiental e
de comunicação, e mais do que isso, estabelece uma estratégia coerente com os
seus princípios, coerentes com a legislação, especialmente a Lei 6.938/1981, da
Política Nacional de Meio Ambiente.
O consumidor também deverá atuar no cumprimento
da nova Lei, conforme estabelecido em seu decreto regulamentador (Decreto
7404/2010), que o obriga a “acondicionar adequadamente e de forma diferenciada
os resíduos sólidos gerados” e a disponibilizá-los adequadamente.
Da mesma forma, educação e comunicação serão
essenciais na estruturação e no lançamento de campanha nacional pela coleta
seletiva, de orientação aos cidadãos; para os convênios firmados com a maioria
dos estados brasileiros para a elaboração de estudos de regionalização e
diagnóstico da situação da gestão e manejo dos resíduos sólidos; no apoio à
estruturação e ao fortalecimento dos Consórcios Públicos entre os municípios
para a gestão de resíduos; e, na realização de estudos de custos de implantação
e operação de diversas instalações de apoio à gestão de resíduos.
O artigo 3° da Lei n° 9.795/99 - que
dispõe sobre a Política Nacional de Educação Ambiental - determina que no
“processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental”. Já o
Artigo 77°, do Decreto n° 7.404 de 2010 – que trata da Educação Ambiental na
Gestão dos Resíduos Sólidos - os órgãos públicos ambientais (federal, estaduais
e municipais) deverão se organizar e estabelecer procedimentos e normas para o
planejamento e execução dos programas de EA.
Como garantir que essas políticas
públicas de educação ambiental e gestão de resíduos sólidos sejam articuladas e
efetivadas, cumprindo-se seus objetivos e os princípios constitucionais? O
primeiro passo foi dado pelos participantes das audiências publicas do Plano
Nacional de Resíduos Sólidos, quando indicaram claramente a necessidade de
definição de conceitos, diretrizes, estratégias e ações de educação ambiental
ou educação para a sustentabilidade, para o consumo sustentável, a capacitação
e a comunicação. Será preciso para tanto metodologias educativas e
comunicativas, capazes de sensibilizar, informar e capacitar os vários atores
dessa cadeia, de estudantes, setor empresarial e trabalhadores, até o poder
público, os catadores e o conjunto da sociedade civil.
Durante as audiências publicas, foi destacada a
disseminação de conhecimentos sobre a reciclagem e aplicação de seus produtos ,
bem como a necessidade de atuação firme do poder público no licenciamento e
fiscalização da gestão dos resíduos sólidos em geral. É reconhecida a
correlação desse campo com a EA no âmbito do SISNAMA e do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos, gerando demandas específicas que devem
receber atenção especial, uma vez que são estruturantes no cumprimento de
designações e metas do PNRS. Embora diversos relatos referentes ao poder
público municipal demonstram a existência de uma rotina em várias cidades,
quanto à sensibilização dos gestores sobre reutilização e reciclagem, outros
revelam a falta de ação educativa continuada junto à população. No âmbito do
setor privado, ficou evidente a necessidade de se desenvolver e propagar, como
prioritárias, a dimensão educativa, comunicativa e participativa, na
implantação e consolidação da nova gestão de resíduos sólidos, superando o viés
meramente tecnológico e logístico.
O fortalecimento da gestão de resíduos sólidos
certamente estará condicionada a tornar explícito e “consciente”, os conceitos
fundamentais da qualidade ambiental, como ciclo de vida; mudanças climáticas;
construção sustentável; rotulagem ambiental, poluição de corpos hídricos, entre
outros, demonstrando a complexidade e envolvimento com outras políticas
públicas que devem dialogar e interagir mútua e reciprocamente.
O papel da EA se insere no contexto da gestão de
resíduos sólidos também como um eixo de articulação dessas diversas políticas
setoriais oferecendo a oportunidade de potencializar o uso dos diversos tipos
de recursos necessários com ações sinérgicas e integradas, como instrumento,
portanto, de mobilização e articulação social, desenvolvimento de capacidades e
capacitação, em condições de atender aos segmentos estratégicos de resíduos
sólidos, em especial os que atuam transversalmente na gestão, como os catadores
e gestores municipais e os de cada setor de interesse direto, como o industrial
e o de mineração. No caso dos catadores, ações estratégicas de educação e
informação, em todos os níveis da administração pública, devem dispor esse
segmento social, ao mesmo tempo, como receptor e difusor das novas dinâmicas
propostas pelo PNRS, assumindo a condição de agentes de educação e mobilização
socioambiental, num contexto proposto pela Lei que torna cada vez mais digno o
seu trabalho e função social. Sem eles, seria inatingível o desafio de se
transformar mais de 80% do lixo atual em resíduo aproveitável.
Nas audiências, os catadores contribuíram
decisivamente. Serão também fundamentais no contato direto com a população,
propagando novos valores e boas práticas. Outra dimensão relevante que dialoga
com os processos educativos é a ampliação e fortalecimento do controle social.
A experiência e a história revelam que o processo de participação social se
desenvolveu em diálogo com a gestão ambiental compartilhada, e se constitui em
um poderoso e eficaz mecanismo para motivar e sensibilizar os cidadãos,
inclusive entre os segmentos menos mobilizados. Exemplo disso foi a 3ª
Conferência Nacional de Meio Ambiente, realizada em 2008, quando delegados
vindos de todo o país, aprovaram a erradicação dos lixões no Brasil, o que foi
ratificado, dois anos depois, pela Lei da PNRS.
Diante deste quadro, o MMA tem como desafio para
2012 desenvolver e enriquecer o PNRS em sua nova etapa de detalhamento. São
duas grandes ações: a primeira, já em curso, é a formulação de uma plataforma de EA, contendo as estratégias e ações
para a implementação e consolidação das diretrizes e procedimentos da PNRS,
tendo como instrumento, a educação ambiental e a comunicação social. A
Plataforma informará, além de conceitos e diretrizes, como aplicar metodologias
educativas no processo de sensibilização dos vários atores que possibilitem ao
Ministério estruturar um Programa Nacional de Educação Ambiental para a Gestão
de Resíduos Sólidos.
A segunda, complementar e concomitante à primeira,
será implementar nacionalmente uma série de eventos envolvendo as redes
sociais, coletivos, universidades e demais organizações sociais.
Um grande desafio está lançado e pode ser resumido
na seguinte afirmação: não são apenas os lixões, todo o lixo deve ser
erradicado, na construção de um Brasil verdadeiramente sustentável!
Andrea Carestiato, Nilo Diniz e Renata Maranhão